Imagine a seguinte cena: você está com dor de cabeça há dias, toma analgésicos e não melhora.
Decide buscar atendimento no hospital mais próximo porque não aguenta mais sentir essa dor constante. Logo no atendimento, o recepcionista pergunta seu nome e seus sintomas. Ao ouvir o seu relato, você é imediatamente transferido para uma sala de cirurgia e escuta a seguinte frase: “Olá, meu nome é Dr. Fulano, sou anestesiologista e hoje eu farei uma cirurgia no seu cérebro para te livrar da dor de cabeça”. Tudo acontece assim, de imediato. Não houve uma consulta para avaliação clínica, não houve consulta com um especialista, nem ao menos qualquer tipo de exame que indique algum possível diagnóstico. A cena descrita, é claro, é fantasiosa, pelo menos no contexto humano. Para os nossos condomínios, a realidade não difere muito deste relato excêntrico. Surge uma manifestação patológica no edifício, não há consulta com nenhum especialista e logo temos lá o Seu Beltrano, experiente faz-tudo, colocando o edifício na “mesa” e performando uma “cirurgia” milagrosa que expurgará todo o mal.
Quando ouvi esta analogia, há algumas semanas, nas palavras do Eng. Lawton Parente, me peguei pensando no porquê isto acontece. Por que não aceitamos que nossa saúde seja tratada com desleixo, mas, ao mesmo tempo, não valorizamos um processo diagnóstico adequado dos problemas que ameaçam as edificações nas quais moramos? Seria uma questão de falta da cultura de manutenção adequada? Seria a vontade (ou necessidade) de economizar que nos impele ao “barato”, considerando tais intervenções um gasto excessivo, em vez de um investimento no próprio patrimônio? Ou seria simplesmente a desinformação, que nos conduz ao caminho ingênuo de acreditar que os problemas são simples e as todas as soluções de domínio público? Particularmente, eu acredito que seja uma mistura das opções acima, aliada a muitos outros fatores humanos no processo (se você já participou de uma assembleia de condomínio, sabe a dificuldade de levar todos a um lugar-comum).
Mas agora a boa notícia: a situação está mudando, a passos lentos, mas visivelmente evoluindo. É cada vez maior a presença de síndicos e síndicas profissionais (ou síndicos moradores bem instruídos) nos condomínios, que conhecem as responsabilidades do cargo e entendem que qualquer manifestação patológica, por menor que seja, demanda atenção, estudo de causas e tratamento adequado. Desta forma, estamos mudando uma “cultura de não-manutenção” ou do “barato que sai caro” para uma cultura de cuidado e dedicação à saúde das edificações, que evita colocar o condomínio na mesa de cirurgia antes do diagnóstico adequado, prioriza a segurança e conforto dos seus ocupantes e investe na valorização do patrimônio de todos.
Leopoldo Vinter é Engenheiro Civil, especialista em Gerenciamento de Projetos para Engenharias, fundador e responsável técnico da Eule Engenharia e elaborador do Manual do Síndico do CREA-SC /2023