Dia do síndico

Dia do síndico

O barulho do rompedor estava enlouquecendo a Denise, e ela enlouquecendo a mim. Já fazia uma semana que o novo morador do 304 estava com obra no apartamento. Segundo o projeto e ART que ele me passou, todo o piso estava sendo trocado, e aquele equipamento horroroso que produzia um barulho infernal não dava trégua. Denise sofria de enxaqueca, e morava no 204. Era o tipo de pessoa que quando você pergunta se está tudo bem, ela diz que não, e faz questão de explicar o porquê.

Eu estava praticamente fugindo dela, pois não sabia mais o que fazer. A execução da obra estava dentro das normas do Regimento Interno do condomínio, e por mais que fosse desagradável, eu não tinha como barrar o serviço. A própria Denise no ano passado fez algumas alterações e produziu igual transtorno ao Guido do 104, que suportou tudo calado.

Outro dia eu escapuli pra dentro da guarita para não cruzar com ela outra vez. Na primeira vez, naquele mesmo dia, ela me parou no pátio e descarregou toda sua luta inglória com a medicina e conhecimento da analgesia e como aquele barulho a estava deixando pior.

Ontem para não encontrá-la, entrei no salão de festas quando a vi caminhando na minha direção com a mão massageando a têmpora. Para minha surpresa, o salão de festas estava cheio de caixas com docinhos, brigadeiros e canapés. Eu não me recordava de nenhuma reserva, e pra piorar, duas funcionarias cochichavam e não puderam disfarçar.

Ficamos as três paralisadas, até que a Rosi respondeu ao meu olhar inquisidor, dizendo que era festa da Dona Denise. Como assim? Pelo que entendi, ela está numa semana terrível... O cheiro de mentira ficou no ar.

No que eu saio do salão de festas encontro o piscineiro equilibrando três refrigerantes de dois litros. Mais um que ficou assustado ao me ver e eu já indignada pois o trabalho dele é só nas primeiras horas do dia e não pra ficar zanzando pelo condomínio naquela hora da tarde. Ele disse “desculpe Dona Maria, acabei demorando”. Eu não fazia ideia do que ele estava falando.

Outros funcionários já vinham se aproximando. Jardineiro, porteiro, zelador. Alguns moradores também, inclusive a Denise e a Célia do conselho. “Você não para quieta Maria, estragou a surpresa”, me disse o Jeremias do décimo primeiro. Segui pra dentro do salão de festas novamente, quase arrastada por toda essa gente, até que eles me cercaram e cantaram um parabéns a você, com direito a um “viva nossa síndica”. Só aí percebi que eles queriam comemorar o dia do síndico com uma surpresa pra mim. Fiquei tão emocionada e eles exigiram “discurso, discurso”.

Comecei a falar no exato momento que ligaram o rompedor no 304. Falei o quanto eu estava cansada de estar sempre tendo que fazer milagres e como seria bom se todos fossem mais compreensivos. Desabafei mesmo. Mas ninguém ouviu por causa do barulho vindo lá de cima. Quando terminei de falar todos sorriram e aplaudiram, como se meu discurso tivesse sido meigo e doce. Fiquei grata pela festa e pelo rompedor.

Martinha Silva é escritora, graduada em Administração, especialista em Gestão de Pessoas e gestora condominial em Itajaí.

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