Moradores de dois dos maiores residenciais da cidade relatam que viraram reféns do medo e da violência.
Grupos criminosos que atuam dentro e fora dos presídios e multiplicam a violência pelo estado tomam conta de onde deveria ser o lar de famílias carentes. Dois dos maiores conjuntos residenciais de Joinville, no Norte do estado, construídos pelo programa Minha Casa Minha Vida, do Governo Federal, se tornaram bases do crime organizado, diz a polícia.
Esse tipo de crime não é novidade em Santa Catarina. Há cerca de três anos, moradores de Criciúma e Chapecó viveram situações semelhantes. Famílias chegaram a ser expulsas de seus imóveis por criminosos. O tempo passou e nenhuma medida anunciada à época freou a atuação dos criminosos.
Situação em Joinville
Agora em Joinville o problema atinge o maior condomínio popular do estado, onde moram quatro mil pessoas e outro, com 1,5 mil moradores.
"Os crimes acontecem, na sua grande maioria, fora dos muros destes condomínios. Mas as pessoas envolvidas nestes crimes, e aqui estamos falando de homicídios e tentativas, estão envolvidos com moradores destes condomínios. E isso gera uma preocupação porque as pessoas que habitam são pessoas de bem e aí acaba criando uma situação de temor para quem habita estes condomínios", disse o delegado Fabiano Silveira.
O medo dos moradores é pela guerra entre as organizações criminosas que disputam o domínio de pontos de tráfico.
"A gente está sofrendo porque a gente tem medo de ir na rua, a gente não pode deixar um filho porque é capaz de pegar e ser morto. Estão oferecendo drogas para as crianças, entendeu?", desabafou um dos moradores.
Invasão
Os grupos chegam a invadir apartamentos para ganhar território e impor força. Em um dos residenciais investigados, pelo menos 16 apartamentos já estariam sob o comando dos criminosos.
"Se eles souberem que a janela está fechada ou coisa parecida, eles entram. Eles fazem igual formiga. Um vai passando para o outro os móveis e daí colocam no caminhão e jogam em móveis usados e entram no teu apartamento. Quando você chega, não tem mais nada. Estão só eles ali e aí a pessoa não entra mais", relatou um morador que não quis se identificar.
Outro morador revelou que vive um drama diário: "Eu sinto medo, sinto pavor. Eu estou tomando remédio para dormir. Tem dias que eu fico a noite toda acordada com medo de eles estourarem a minha porta".
Disputa por território
Em um vídeo divulgado pela polícia, criminosos armados aparecem circulando de carro pelo pátio de um dos condomínios. Eles passam no meio das crianças.
A polícia afirma que os criminosos que aparecem nas imagens pertencem a um grupo que domina outro condomínio de Joinville, no território rival, para provocar. Eles estão sendo investigados por porte de arma e organização criminosa armada.
"Esse vídeo evidencia que efetivamente dentro de condomínios há a atuação de integrantes de organizações criminosas e esse vídeo em especial revela o atrito entre as organizações", disse o promotor de Justiça Ricardo Paladino.
O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) investiga a atuação de gupos criminosos dentro dos condomínios e critica a Caixa Econômica Federal, responsável pela fiscalização dos apartamentos.
"Infelizmente temos visto que a Caixa Econômica Federal deveria estar atuando com mais eficiência na fiscalização da ocupação destas unidades residenciais. Nós temos vários apartamentos desocupados que por uma ou outra situação acabam sendo invadidos por pessoas não contempladas para a aquisição destes imóveis e isso gera uma série de problemas, inclusive o descontrole em relação às pessoas que efetivamente estão ocupando cada unidade habitacional", disse o promotor Paladino.
Mortes violentas
A guerra entre grupos criminosos tem feito Joinville ultrapassar o número de mortes violentas ano após ano. Em 2017, pela média, a cidade não chegou a passar três dias sem registrar um homicídio ou latrocínio. Foram 137 mortes violentas no ano passado, 127 mortes em 2016 e 126 mortes em 2015.
Para a polícia, até 80% desses crimes tem relação com a disputa por pontos de tráfico e diz que é difícil conter o avanço dos crimes dentro dos residenciais populares.
"O fato de ter guarita, ser cercado, dificulta o nosso acesso... isso fica difícil da polícia ingressar e é um terreno mais fértil para a criminalidade. A gente perde o elemento surpresa que é essencial para algumas atuações, dificulta o monitoramento do local", afirma a delegada regional Tânia Harata.
Matéria originalmente publicada em: G1