Com uma gestão condominial cada vez mais profissional e estratégica, surge uma pergunta importante: é possível investir o dinheiro que sobra no caixa do condomínio? A resposta é sim, conforme explica Marcelo de Andrade Borba, consultor e professor nas áreas de gestão e negócios, com ampla experiência no mercado condominial.
O especialista defende que o condomínio pode utilizar o fundo de reserva e outros recursos não comprometidos para investimentos, desde que haja deliberação em Assembleia Geral ou conforme previsto na Convenção Condominial, que estabelece as diretrizes de gestão.
“Esse alinhamento é fundamental para garantir segurança e embasamento às decisões. É importante destacar que o síndico tem a atribuição de executar as deliberações da Assembleia, e assumir riscos sem aprovação prévia pode gerar conflitos e consequências administrativas”, destaca Borba.
Antes de aplicar qualquer recurso excedente, é essencial que o condomínio possua um plano estratégico de curto, médio e longo prazo, com prioridades e riscos claramente definidos. O consultor ensina que também é fundamental analisar o fluxo de caixa e confirmar se o excedente está, de fato, disponível — e não é apenas um saldo temporário.
“Os investimentos podem ser direcionados tanto para melhorias físicas, como reformas, substituição de mobiliário ou aquisição de equipamentos, quanto a aplicações financeiras seguras. O ponto central é manter uma visão estratégica sobre o custo de oportunidade, ou seja, avaliar qual alternativa proporciona o melhor retorno para o condomínio”, explica Borba.

Receita essa muito bem executada pelo síndico José Carlos de Farias, que administra, pelo segundo mandato, o Condomínio Edifício Columbus Tower, em Balneário Camboriú. “Minha experiência com os investimentos de valores excedentes do condomínio tem sido focada em garantir que os recursos sejam aplicados de forma eficiente e transparente, visando sempre o benefício coletivo dos moradores. Tenho priorizado investimentos que ofereçam segurança e retorno estável, como os CDIs”, pontua.
Além disso, o gestor busca outras fontes de receita, como economias geradas pela redução de custos operacionais. “Atualmente, os investimentos que tenho mais confiança são em melhorias na infraestrutura do prédio, como a manutenção dos elevadores e a correção de problemas estruturais. Também estamos investindo em tecnologias que aumentem a eficiência energética e reduzam os custos operacionais”, explica Farias.
Para conquistar a confiança e parceria dos condôminos, ele conta que a prestação de contas é realizada mensalmente, com relatórios detalhados enviados aos moradores. Além disso, são organizadas reuniões sempre que se faz necessário para discutir o andamento dos investimentos e quaisquer outras questões relevantes.
Custo oportunidade
Para Borba, quando se fala de gestão financeira, o principal entendimento que ele acredita que o síndico tem que ter é o de ‘custo oportunidade’. Ou seja, saber avaliar o seu contexto e, a partir dele, tomar a melhor decisão. “Tenho observado e encontrado alguns condomínios com investimento financeiros em dia que estão caindo aos pedaços. Falta infraestrutura, manutenção, as cadeiras estão quebradas, o tapete de entrada envelhecido, passando, muitas vezes, uma imagem negativa do prédio”, destaca.
Segundo sua análise, é comum encontrar empreendimentos com taxa de inadimplência, mas com saldo positivo baseado em investimentos externos. Só que isso, para o consultor, não é uma boa estratégia de negócio, pois ele defende que, além do mercado financeiro, investir em melhorias internas também pode ser uma excelente escolha. Por isso, é essencial interpretar o momento e o perfil do condomínio para tomar decisões coerentes com suas necessidades e objetivos.
“O síndico precisa fazer uma boa leitura do contexto e entender qual o momento do seu espaço. Se ele está em momento de investir ou de poupar. De nada vale estar com bons rendimentos em aplicações financeiras se o seu condomínio está com falta de melhorias visíveis, beirando um cenário de abandono”, avalia Borba.
Melhores investimentos
Os especialistas são unânimes: a escolha do investimento deve começar com um diagnóstico do cenário financeiro e estrutural do condomínio. É necessário ponderar riscos, liquidez e retorno. Sendo que, uma das possibilidades mais viáveis é o investimento do valor excedente do fundo de reserva, que pode ser aplicado em modalidades que ofereçam segurança e liquidez. Ou seja, que permitam resgates rápidos em caso de necessidade, como reparos emergenciais.
Para Borba, a melhor aplicação está diretamente ligada ao cenário financeiro, ao perfil de risco e aos objetivos de cada local. Desta forma, cabe ao síndico fazer uma leitura ampla do contexto, revisar a previsão orçamentária, identificar desperdícios e avaliar contratos com valores acima do mercado.
Entre as opções de investimento mais indicadas pelo consultor estão as mais conservadoras e seguras, ideais para o perfil de um condomínio. Fundos de renda fixa, CDBs (Certificados de Depósito Bancário) de liquidez diária, e até mesmo contas remuneradas vinculadas ao CNPJ do condomínio, são alternativas que unem segurança e rendimento.
Fontes de receita adicionais
Além das taxas condominiais, a locação de áreas comuns pode gerar receita extra. Como, por exemplo, locar espaços vazios, fachadas, coberturas, áreas para publicidade em murais, televisores nos elevadores ou em totens, tanto para residentes quanto para não residentes.
O estacionamento, a academia e até mesmo o espaço pet também podem ser utilizados por terceiros para a prestação de serviços profissionais. E, esse montante, quando destinado ao fundo de reserva, fortalece ainda mais a capacidade de investimento.
Entretanto, os especialistas lembram que essas possibilidades devem ser aprovadas em Assembleia, e o Regulamento Interno ou a Convenção do condomínio deve estabelecer regras claras para a aplicação desses recursos.

Responsabilidade
De acordo com a advogada Cleuzany Lott Santos, que atua há mais de 10 anos no segmento condominial, desde que exista previsão na Convenção ou aprovação prévia em Assembleia, o responsável pela aplicação é o síndico, uma vez que ele é o representante legal do condomínio, conforme o artigo 1.348 do Código Civil.
“Nesses casos, o condomínio assume a responsabilidade pelos eventuais prejuízos. Por outro lado, se o síndico agir sem autorização, ele poderá ser responsabilizado pessoalmente por qualquer dano causado ao patrimônio coletivo”, explica a especialista.
Sendo assim, Cleuzany diz que a proposta deve ser apresentada para os condôminos de forma clara, objetiva e bem estruturada, destacando pontos como risco, rentabilidade, prazo, valor aplicado e o objetivo. A advogada lembra ainda que a Assembleia também pode nomear um responsável específico para gerir esse tipo de investimento, como uma assessoria especializada. “Esse suporte ajuda a identificar investimentos compatíveis com o perfil do condomínio, avaliando rentabilidade, transparência e riscos, além de evitar armadilhas como promessas de retorno rápido ou soluções milagrosas”, pontua.
Além disso, ela destaca a transparência como um cuidado essencial. “O síndico deve manter os condôminos bem informados sobre a movimentação financeira e os resultados dos investimentos. Vale lembrar que, a prestação de contas anual é obrigatória. Portanto, a clareza em todas as fases do investimento é fundamental para garantir a aprovação em assembleia e a confiança da coletividade”, pondera Cleuzany.
Impactos da inadimplência
A inadimplência, tanto das taxas condominiais quanto das contribuições ao fundo de reserva, reduz as disponibilidades financeiras do condomínio, comprometendo as sobras de caixa e a possibilidade de realizar investimentos financeiros.

Conforme explica Ademir Tenfen, economista e presidente do Conselho Regional de Economia de Santa Catarina (CORECON/SC), o controle da inadimplência e o estabelecimento de regras e políticas claras de cobrança fazem parte de uma boa gestão financeira condominial.
“No caso de inadimplência alta e crescente, deve-se evitar a realização de investimentos financeiros, pois essa decisão pode resultar na falta de caixa suficiente para pagar as contas do condomínio, comprometendo seu funcionamento e manutenção”, orienta Tenfen.
Cuidados para um melhor desempenho na aplicação financeira:
● Avaliar cuidadosamente as receitas e despesas do condomínio para determinar quanto pode ser investido. Esta verificação pode ser feita a partir da análise da previsão orçamentária e do fluxo de caixa;
● Procurar um profissional ou uma empresa de confiança, especializada em investimentos financeiros, para avaliar o perfil do condomínio, os objetivos do investimento, bem como a rentabilidade e os riscos envolvidos;
● Investir os recursos do condomínio apenas se a situação do fluxo de caixa permitir — ou seja, se os valores arrecadados forem mais do que suficientes para cobrir as despesas de manutenção e conservação do condomínio;
● Definir previamente qual será a destinação dos rendimentos oriundos das aplicações financeiras;
● Os ativos financeiros utilizados devem ser seguros, que contem com a cobertura do FGC (Fundo Garantidor de Créditos), tenham boa liquidez e sejam diversificados;
● Não é recomendado que o condomínio invista em renda variável, como ações, fundos multimercado, fundos imobiliários e criptomoedas, devido ao alto risco de perda do capital investido e à baixa liquidez dessas modalidades;
● Utilizar, preferencialmente, as seguintes modalidades de aplicação financeira, que além de remunerarem o capital investido, garantem boa liquidez e segurança: CDB (Certificado de Depósito Bancário); Tesouro Direto (Tesouro Selic); Fundos DI ou Fundos de Renda Fixa com perfil conservador; Contas digitais com rentabilidade automática; e Poupança (como última opção de investimento).