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Justiça cria jurisprudência ao expulsar casal de moradores antissociais em prédio

Comportamentos reincidentes e mais graves, que não podem ser coibidos nem com multas, começam a ser passíveis de expulsão de condomínio Comportamentos reincidentes e mais graves, que não podem ser coibidos nem com multas, começam a ser passíveis de expulsão de condomínio

O vizinho que toca bateria pela manhã. O chato que não dá “bom dia” para ninguém. A criança que, “acidentalmente”, quebrou o retrovisor do seu carro. O dono do cachorro que costuma uivar durante a madrugada.

Sim, provavelmente, você convive (e vai continuar convivendo) com alguns desses personagens. Ao menos aos olhos de especialistas e da própria Justiça, eles não se enquadram no chamado “comportamento antissocial”.

Mas comportamentos reincidentes e mais graves, que não podem ser coibidos nem com multas, começam a ser passíveis de expulsão de condomínio.

O tema voltou aos holofotes nas últimas semanas porque um edifício de alto padrão, no bairro de Perdizes, zona oeste de São Paulo, obteve decisão judicial para a expulsão de um casal de médicos – em um caso que se arrastou por seis anos.

“A Justiça entendeu que, se não houvesse uma expulsão, a situação poderia terminar em tragédia. Uma decisão assim só acontece quando a percepção é de um grave problema iminente”, contou o advogado do condomínio, Fauaz Najjar. “Eu mesmo precisei ir a uma reunião de condomínio para ouvir dos moradores e entender a gravidade da situação. A convivência no prédio já estava perigosa.”

“Não deve ser um recurso banalizado. Mas o que está acontecendo agora é o início de uma jurisprudência”, afirmou o advogado especialista em direito de condomínios Jaques Bushatsky.

Segundo relatos de moradores, o casal chegou a agredir fisicamente alguns vizinhos – e o convívio atribulado rendeu boletins de ocorrência e visitas ao Instituto Médico-Legal (IML).

“As crianças tinham medo de entrar no elevador e dar de cara com o casal. O prédio inteiro estava em pânico. A gente chegava em casa, depois de um dia inteiro de trabalho, e em vez de relaxar ficava tenso, esperando algo muito ruim acontecer”, disse Rodrigo Vianello, ex-síndico do prédio, que teve a ideia de procurar um advogado para tratar da expulsão do casal.
Para a gerente de relacionamento e comunicação da Lello Condomínio, Angélica Arbex, o fato de o condomínio procurar um advogado para tratar de uma questão entre vizinhos já demonstra que a situação chegou ao limite. “O recomendável sempre é o diálogo.

Se não der certo, tem ainda a hipótese de advertências e multas. Ao chegar à Justiça, encontramos um caminho quase que sem volta para a boa convivência”, disse. “Os edifícios precisam criar espaços de convivência para que as pessoas se conheçam melhor, para que elas possam conversar de forma construtiva e encontrar consensos que atendam às necessidades de todos”, completou.

PublicidadeFechar anúncio Código Civil não prevê a expulsão
A expulsão do condomínio não está prevista em lei. No artigo 1 337 do Código Civil, a punição para comportamentos considerados antissociais é a multa – que pode atingir até dez vezes o valor do condomínio. No caso dos médicos, todas as outras hipóteses já haviam sido tentadas.
A sentença de expulsão foi dada pela 16ª Vara Cível de São Paulo. E, embora tenha sido uma decisão de primeiro grau, o casal não entrou com nenhum recurso e, imediatamente, colocou o apartamento para locação. O advogado de defesa do casal foi procurado pela reportagem, mas informou que nem ele nem seus clientes iriam se manifestar. “É importante salientar que, nesses casos, o morador não perde o direito à propriedade. Ele é proibido de conviver naquele condomínio – devendo vender ou alugar o imóvel”, explica o advogado Jaques Bushatsky.

Em 2017, um morador foi expulso de um edifício no bairro de Moema (SP) por comportamento antissocial. O morador em questão ficou conhecido por ficar nu na academia do prédio, promover orgias na piscina. Como provocação, comparecia a reuniões de condomínio vestido de Batman. “Chegamos a aplicar o máximo possível de penalidades e multas. Mas, acredito, ele era rico ou não se importava. A situação chegou a um ponto em que a única saída era a expulsão”, contou Natachy Petrini, síndica profissional que administrava o edifício na época.

Todas as medidas extrajudiciais possíveis foram adotadas pelo condomínio: moção de repúdio, multas, majoração das multas até dez vezes o valor do condomínio, ajuizamento de ações criminais, mas nada impedia o condômino de continuar a descumprir a lei e as regras exigidas de convivência.

Saiba mais

Em sua sentença, a juíza Inah de Lemos e Silva Machado, responsável pelo julgamento do caso de Moema, escreveu: “Ainda que inexistente previsão legal quanto à possibilidade de exclusão de condômino, pelo fato de o Código Civil limitar-se à aplicação de multa, em seu artigo 1.337, a jurisprudência e a doutrina entendem pelo seu cabimento, como medida excepcional e extrema.”

Fonte: www.jornaldebrasilia.com.brjornaldebrasilia.com.br