Imprimir esta página

A busca de conhecimento é fundamental para exercer uma gestão de qualidade

A busca de conhecimento é fundamental para exercer uma gestão de qualidade

 

Rosely Benevides de Oliveira Schwartz é contabilista e administradora, com MBA em Gestão de Facilidades na Universidade de São Paulo (USP), especialização que trata sobre a eficiência na operação de edifícios, principalmente nos de grande porte e com novas tecnologias, os chamados edifícios inteligentes. Autora do livro “Revolucionando o Condomínio” é, desde 1998, professora de Gestão de Condomínios da Escola Paulista de Direito (EPD).

Schwartz esteve em Florianópolis (SC) para ministrar o curso de Administração de Condomínios e nos concedeu uma entrevista esclarecendo assuntos polêmicos como NBR 16.280, as sucessivas responsabilidades atribuídas aos síndicos, além de orientações para uma gestão de qualidade.

Jornal dos Condomínios - A senhora atua há 20 anos na área de condomínios. Como iniciou o seu trabalho no setor?
Rosely Schwartz - Sim, em 1994 eu desenvolvi uma pesquisa envolvendo mais de 100 condomínios paulistas e o resultado desse trabalho foi veiculado em uma reportagem na Folha de São Paulo. Naquela época não existia muita informação a respeito de condomínios e eu tinha em mãos um material tão amplo sobre o assunto que decidi apresentar o projeto para uma editora. Em 1996, lancei o livro “Revolucionando o Condomínio”, pela Editora Saraiva, e hoje a publicação está na 14ª edição, ampliada e atualizada.

Quais foram as mudanças mais expressivas no setor nesses últimos anos?
Uma mudança significativa que percebo é o interesse de pessoas mais jovens se dedicando à função de síndico. Antes o perfil era de senhores, aposentados, e atualmente há muitos jovens de 20, 25 anos ocupando esse cargo. E, também, não havia muitas mulheres, era um setor predominantemente masculino. Além disso, houve grande crescimento das exigências legais, principalmente as tributárias.

Qual a sua opinião sobre o conteúdo da norma NBR 16.280 que regulamenta as reformas em edificações?
A publicação da norma foi bastante importante. Sempre que ministro cursos de gestão de condomínios enfatizo o artigo do Código Civil onde diz que é proibido ao morador a execução de obras que prejudiquem a segurança do edifício. Com base nesse item sempre focava a importância das reformas internas nas unidades serem levadas ao conhecimento da administração para que houvesse um controle.

Pelo fato de também ser síndica e conviver com essas questões na prática cotidiana é possível perceber que o condômino acha que na sua unidade é ele quem manda e que tem o poder de reformar conforme sua vontade, mas sabemos que não é bem assim. Para o morador, o fato de mudar uma parede para ampliar a cozinha, por exemplo, pode parecer uma coisa simples, mas se for uma parede estrutural, a reforma pode colocar em risco toda a edificação.

Já orientava meus alunos para que inserissem no regulamento interno a necessidade de o morador informar o síndico sobre a reforma, os prazos e os profissionais que executariam a obra, para dar mais segurança ao condomínio. Porém, não havia como exigir que um engenheiro ou arquiteto se responsabilizasse e acompanhasse a obra que trouxe alteração na estrutura e a norma veio justamente dar este suporte para que o síndico possa fazer as exigências.

Antes, o síndico era apenas um “intrometido” e agora não. É importante que se esclareça que a norma não é lei, mas possui força suficiente para que, no caso de qualquer irregularidade, seja possível apontar as responsabilidades, e este é um ponto fundamental. A norma esclareceu que, cabe ao síndico a responsabilidade das obras executadas nas áreas comuns e buscar responsáveis pelas obras realizadas nas áreas privativas. Ele, como gestor, deve dividir a responsabilidade contratando profissionais habilitados, que no caso de alteração de qualquer estrutura tenham condições de realizar um projeto, acompanhar e recolher Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) – para os engenheiros - ou Registro de Responsabilidade Técnica (RRT) – para os arquitetos. Portanto, deve-se evitar o perfil daquele prestador de serviço que “faz tudo”.

Os moradores também têm suas obrigações e uma delas é informar o síndico de tudo que será realizado na unidade, desde uma simples pintura até uma grande reforma. Informar e manter o que foi determinado através de um histórico do que será feito, dos materiais que serão utilizados, onde serão guardados e quais os profissionais que vão executar a reforma. São dados importantes e que não eram considerados antes. Por exemplo, a construtora entregou o piso da unidade com um tipo de acabamento e para substituir por outro material é necessário saber se a estrutura, se a laje do imóvel suporta essa mudança. A norma vai fazer com que as pessoas repensem mais sobre essas questões de segurança e tenham a consciência de que não moram em uma construção autônoma, mas em um imóvel coletivo.

Os síndicos podem adotar imediatamente a norma como procedimento-padrão para as reformas em condomínios? 

O Código Civil trouxe um item importante no sentido de definir as responsabilidades dos síndicos e a norma, do mesmo modo, o coloca como responsável pela edificação. Ele não poderá ser omisso. Dessa forma, recomendo que o síndico realize uma assembleia para informar aos moradores que passará a utilizar a norma como referência e explique quais os critérios que serão adotados no condomínio. Na pauta, devem constar os prazos para os moradores apresentarem os documentos antes do início da reforma, os prazos para liberação e as sanções que serão aplicadas ao infrator que poderá ser, por exemplo, a solicitação por escrito da paralização da obra, aplicação de multa, no caso de não ser atendido o pedido, e até a denúncia na prefeitura. Na assembleia também deve ser discutido como será a guarda dos documentos, pois constituem um histórico do prédio e das unidades e devem ser arquivados para sempre. A ata da reunião deve ser entregue a todos os moradores e a partir disto o síndico terá o respaldo para exigir que as normas sejam cumpridas.

A aplicação da norma trará custos adicionais para os condomínios?
Sim. Nas reformas dentro das unidades, o morador deve apresentar um projeto ou laudo da obra, o seu responsável legal e todo o custo será do morador. Porém, se o síndico tiver algum questionamento sobre o que foi apresentado terá de contratar outro profissional que avalie se está tudo correto e o custo será do condomínio.

No caso de obras nas áreas comuns também haverá o custo de projetos e da contratação de profissionais legalmente habilitados para fazê-los. É importante frisar que sempre que houver a intenção de realizar alguma reforma no condomínio esse valor seja levado em consideração.

O síndico deve tomar cuidado com a contratação dos profissionais porque a questão não é somente obter um laudo para legalizar a obra, mas sim escolher um profissional realmente habilitado e com quem ele poderá dividir a responsabilidade. As administradoras poderão auxiliar muito nesse aspecto, indicando profissionais da sua carteira e diminuindo os custos para os condomínios.

Quais as dificuldades que os síndicos podem encontrar nesse período inicial?
Acredito que levará um tempo para que as pessoas se acostumem com as novas regras e poderá haver um desconforto tanto para os moradores como para os síndicos. Entretanto, é importante que os gestores se conscientizem de que as regras são necessárias e que eles estão, justamente, zelando pela segurança de todos.

As exigências legais para a gestão de condomínios aumentaram muito nos últimos anos?
Atualmente a gestão de um condomínio se assemelha muito à de uma empresa, pois tem uma grande movimentação financeira e várias exigências legais nas áreas fiscais, tributárias e trabalhistas. Nesse sentido, a busca de conhecimento é fundamental para se exercer uma gestão de qualidade. O síndico deve procurar informa-se dos assuntos relacionados à gestão e buscar conhecimento através de leituras especializadas, cursos e palestras para acompanhar essa mudança. Ainda é possível perceber muitas irregularidades em condomínios que se constituem em verdadeiros passivos, e no caso de alguma fiscalização poderá trazer muitos problemas e prejuízos financeiros.


Quais são as maiores dificuldades relatadas pelos síndicos na gestão dos condomínios?
Além das questões legais da administração e que exigem atenção constante, as maiores reclamações são em relação aos conflitos relacionados às vagas de garagem, animais e barulho. Uma atitude importante na mediação de conflitos é saber ouvir e desenvolver uma empatia com as pessoas, mas, às vezes, os síndicos não estão preparados para fazer essa mediação. Uma boa alternativa é contar com as Câmaras de Mediação e Conciliação implantadas pelo Judiciário ou as particulares existentes, que poderão tratar desses problemas com maior imparcialidade.

A contratação de bons prestadores de serviços e que atendam as necessidades do condomínio é uma preocupação para os síndicos. Quais as suas recomendações para não errar na contratação?
O síndico poderá solicitar a um profissional habilitado, que não tenha como atividade a execução da obra em estudo, um escopo do que será realizado. A partir daí é possível dar início às solicitações dos orçamentos e fazer as comparações de valores, materiais e marcas que serão usados, acabamentos etc. O síndico poderá contratar um profissional para fazer o trabalho ou contar com o apoio dos próprios moradores. Eu recomendo sempre que haja uma administração compartilhada e, muitas vezes, há no próprio condomínio um morador que possui habilitação para auxiliar o síndico. Cito como exemplo: engenheiros, arquitetos, eletricistas, que poderão dar a sua colaboração ao condomínio, sem custos.

Mas é comum os síndicos solicitarem o escopo da obra?
Não. A maioria não utiliza o escopo para a tomada de preço e, às vezes, a empresa contratada entrega o serviço da forma que lhe convém. É importante que haja a formalização em contrato de tudo que foi acordado e caso haja necessidade o síndico possa contar com supervisão de um profissional que irá verificar se o contratado foi realizado, evitando-se assim o retrabalho, fato que acontece muito nos condomínios. Faz-se a obra e é necessário refazer porque não ficou de acordo com o esperado.

Síndicos respondem na esfera civil e criminal por danos aos condomínios. São comuns as ações judiciais envolvendo síndicos?
Sim. Podemos citar casos de acidentes em elevadores que não receberam a devida manutenção, a realização de obras sem o isolamento necessário à segurança de terceiros, acidentes causados pela presença de óleo no piso da garagem, entre outros. Os síndicos podem sofrer ações de responsabilidade civil se ficar comprovado que ele não tomou os cuidados necessários para evitar acidentes. A lei diz que ele não pode ser omisso, negligente ou imprudente (Art. 186 – Código Civil). As indenizações são altas e ele terá de pagar através de patrimônio próprio e não do condomínio.

Florianópolis já faz parte da sua agenda de cursos e palestras? Como vê o cenário de condomínios da região comparando com os grandes centros do país?
Sim. Graças ao trabalho empreendedor da Diretora Ângela, do Jornal dos Condomínios, que se preocupa em ampliar o conhecimento dos gestores de condomínio, para que haja maior eficiência, segurança e tranquilidade. Tenho reservado pelo menos duas vezes por ano um período para poder estar em Florianópolis, que tem me dado grande prazer em colaborar com o aprimoramento do conhecimento necessário para uma gestão condominial.

Observo que os problemas apontados nos cursos e nas palestras são os mesmos encontrados em qualquer região do país. Segundo dados do IBGE, de 2012, Santa Catarina ocupa o sétimo lugar em número de pessoas que moram em apartamentos. Devido o desenvolvimento da região esse número tende a aumentar rapidamente, inclusive com a construção de edifícios mais complexos, os chamados condomínios-clubes, que possuem uma série de serviços e equipamentos que demandam maior capacitação dos gestores e funcionários.

Existe uma receita para uma boa gestão de condomínio?
Minha orientação é a de dividir as responsabilidades, nunca centralizar nem administrar sozinho, pois isso traz um peso muito grande. Tenha uma política de gestão compartilhada juntamente com os conselheiros, funcionários, administradoras e moradores, buscando envolvê-los para que haja participação. Outro ponto fundamental para uma gestão de qualidade é o alto comprometimento da empresa administradora com o cumprimento das normas, tais como: convenção, segurança contra incêndio e higiene, tributária, fiscal e trabalhista.